quarta-feira, 1 de outubro de 2008

AMOR DESEJO DE COMPLETUDE - por Flávio Gikovate

Nunca me canso de refletir sobre a idéia bíblica de que o início da vida se deu no paraíso, onde nada faltava. Logo depois, não importa por quais razões, vem a expulsão do paraiso e o início das nossas dores.
O que me impressiona é que é assim mesmo que as coisas acontecem: estávamos no útero, protegidos, alimentados e livres de todas as dificuldades. Assim se forma nosso cérebro, cujo primeiro registro é o do delicioso eqülíbrio e paz.
De repente, vem a ruptura da bolsa e o início das dores do parto. A expulsão se dá e, a partir daí temos frio, fome, sede, dores e, principalmente, a sensação de abandono e desproteção. Ou seja, nascer significa uma transição dolorosa: passamos de uma situação melhor para uma pior. Se o primeiro registro cerebral é, como disse, o de paz e harmonia, o segundo corresponde à inesperada ruptura desse eqülíbrio. Essa ruptura ocasiona uma dramática experiência traumática. Estou usando o conceito de "trauma" no seu sentido correto: a experiência traumática marca e deixa cicatrizes que irão influir definitivamente sobre nosso destino e sobre a evolução da nossa subjetividade.
Do nascer sobra a cicatriz física, que é o umbigo. Sobra também uma cicatriz psicológica que corresponde, entre outras coisas, a uma nostalgia da condição anterior. Parece que essa sensação nos acompanha ao longo de toda a vida. Sentimos sempre que algo está nos faltando, que estamos de certo modo, incompletos.
Por mais agradável que esteja a vida, há sempre uma lembrança da perfeição perdida, que nos provoca um gosto amargo e uma certa insatisfação. A lembrança do útero, do paraíso perdido, nos persegue e é capaz de tirar parte do prazer que porventura estejamos sentindo.
Ficamos, pois, definitivamente comprometidos com essa sensação de incompletude. Parece que temos um permanente "buraco" na boca do estômago. Essa sensação é, provavelmente, responsável pelo sentimento de inferioridade presente em todos nós. Isso porque não sabemos que essa sensação é universal. Nós a sentimos, mas não imaginamos que os outros a sintam: assim, julgamo-nos inferiores.
Várias são as conseqüências de a vida se iniciar dessa forma. A mais marcante talvez seja a que diz respeito ao fenômeno do amor. A dramática sensação de desamparo que vivenciaamos ao nascer se atenua quando nos reaproximamos fisicamente de nossas mães, sobretudo na hora da amamentação . Aprendemos que o "buraco" diminui com a sua presença física, com sua proteção concreta e também com o aconchego abstrato que ela nos faz sentir. Assim, aprendemos que o melhor remédio para a sensação de incompletude é a aproximação física com a nossa mãe. É no colo dela que experimentamos a sensação mais parecida com a do paraíso uterino definitivamente perdido.
Buscamos ficar próximos de nossa mãe porque ela nos traz de volta a paz e a harmonia que um dia sentimos como permanentes. Só que agora isso se alterna com períodos de dor, desespero, angústia e "buraco" no estômago. Não há como estarmos permanentemente no colo da mãe, aconchegados por sua presença protetora.
Se definirmos o amor como o desejo de reencontrar a paz e a harmonia perdidos com o nascimento, por meio da aproximação física (e depois espiritual) com outro ser humano - que nos dá a sensação de completude que não temos quando estamos sós -, compreendemos que nosso primeiro objeto de amor é nossa mãe. Compreendemos também que todos os objetos posteriores são substitutos desse amor original. Como o desejo de nos "completarmos" nos persegue ao longo de toda a vida, podemos dizer que o amor é um dos desdobraments fundamentais do trauma do nascimento. Se nascer não fosse uma transição para o pior, para a dor, decerto não existiria o amor: ao menos o amor como nós o conhecemos.

Dr. Flávio Gikovate - médico psiquiatra, diretor do Instituto de Psicoterapia de São Paulo e autor de vários livros, entre eles, Home, o Sexo Frágil? E A Arte de Viver Bem.

TAMBA-TAJÁ - Por Fafá de Belém

"Tamba-tajá é uma planta nativa da Amazônia e, devido a sua lenda, considerada sagrada pelos índios macuxis e pelos caboclos marajoaras.
Segundo a lenda, havia um índio macuxi perdidamente apaixonado por uma índia de sua tribo e, como ela era paralítica, carregava-a amarrada às costas para onde quer que fosse.
A paixão alucinante do índio era o que lhe dava forças para vencer os obstáculos que a cada momento lhe surgiam à frente. Principalmente por que os macuxis viviam sem pouso certo.
Um dia, caminhando pela mata, o índio (casal) deparou-se com uma tribo inimiga, que logo o(s) reconheceu e saiu em sua perseguição. A luta foi desigual mas o macuxi conseguiu escapar ileso com sua companheira. Entretanto, durante a fuga, o índio sentiu que a cada momento a índia pesava-lhe mais aos ombros. Refugiou-se à beira de um igarapé e então notou que sua amada estava morta. Ali mesmo fez uma cova e, não vendo mais sentido em continuar vivendo sem aquele amor, enterrou-se junto com ela.
Na lua cheia, naquele mesmo lugar, nasceu o tamba-tajá.
O tamba-tajá é uma planta muito festejada pelos nativos, não apenas por sua graça e feminilidade mas, principalmente por seus mistérios e segredos.
Sua forma é simples, semelhante a um triângulo.
Sua cor é verde, com nuances escuras espalhadas pela palma da folha.
A tessitura é macia, meio aveludade tal a pele de um bebê, levemente marcada por veios de linhas aparentes.
Se bem observado, o tamba-tajá tem um detalhe curioso, que de certa forma reforça a origem da lenda: abaixo de seu vértice mais alongado, acha-se acoplada uma outra folha, em tamanho minúsculo, cuja forma se assemelha ao órgão genital feminino. O acasalamento dessas folhas simbolizam o índio macuxi e sua amada.
Na Amazônia e principalmente nas casas precárias do interior, o tamba-tajá é considerado como planta decorativa e é colocada uma folha atrás da porta, para assegurar aos casais moradores o eterno amor, pois segundo o dito popular "quem tem o tamba-tajá seu amor não perderá".

(Fafá de Belém).